A morte nos faz cair em seu alçapão, / É uma mão que nos agarra / E nunca mais nos solta. / A morte para todos faz capa escura, / E faz da terra uma toalha; / Sem distinção ela nos serve, / Põe os segredos a descoberto, / A morte liberta o escravo, / A morte submete rei e papa / E paga a cada um seu salário, / E devolve ao pobre o que ele perde / E toma do rico o que ele abocanha.
(Hélinand de Froidmont. Os Versos da Morte. Poema do século XII. São Paulo : Ateliê Editorial / Editora Imaginário, 1996. 50, vv. 361-372)

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Pará: Soledade vai ser transformado em cemitério-parque

Pesquisas no Cemitério Nossa Senhora do Soledade revelam aspectos sociais de Belém do século XIX


Texto: Dandara Assunção, Agência Museu Goeldi.
Fotos: Carmem Trindade, Dandara Assunção e Fernando Marques.
Notícia publicada no "Museu em Pauta" - Informativo eletrônico, n º 40 - Belém, 28 de agosto de 2008.




Construído no Século XIX, o Cemitério Nossa Senhora da Soledade, localizado à Avenida Serzedelo Corrêa, no centro de Belém, constitui um patrimônio para o povo paraense não só pela sua história, mas também pelo acervo arquitetônico que abriga. A exemplo do que acontece em outras grandes cidades no mundo, o sítio histórico será transformado em cemitério-parque. O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) financia a iniciativa de “Conservação, Consolidação e Restauração e Adaptação do Soledade em Cemitério-Parque”. O projeto de levantamento histórico e arquitetônico é executado pela empresa R2 Arquitetura LTDA, e conta com o apoio do Museu Paraense Emílio Goeldi, na realização de investigação arqueológica, coordenada pelo arqueólogo Fernando Marques, do (MPEG).

O cemitério foi tombado como patrimônio paisagístico nacional pelo Iphan em 1964. Construído por volta de 1850 quando epidemias de febre amarela, cólera e varíola dizimaram cerca de 30 mil pessoas, o cemitério foi desativado em 1880, pelo então presidente da Província do Pará, José Coelho da Gama e Abreu, que suspendeu os enterramentos no Soledade. Estudos apontavam que o solo misto de argila e areia, era impróprio para enterros. “O solo tende a ficar mais enfraquecido com a decomposição dos corpos”, explica Fernando Marques sobre as condições do solo do Soledade.

Antes da epidemia, os mortos eram enterrados nas igrejas da cidade, com exceção dos escravos que já eram sepultados em cemitérios. “A epidemia matou inúmeras pessoas, por isso a necessidade de serem enterradas em cemitérios e não mais em igreja. Era preciso que a cidade passasse por um processo de higienização urbana”, explica a historiadora da UFPA, Cássia Rosa, que também integra o projeto de revitalização do cemitério.





Arte para homenagear os mortos - Para edificar o cemitério, muitas famílias ricas importavam os mausoléus do exterior, principalmente da Europa, como uma forma de homenagear os familiares mortos pela epidemia. Por essas razões, a arquitetura das sepulturas do Soledade revela fortes influências de diversas escolas artísticas, como o clássico, que seguia linhas da arquitetura grega, e Art Nouveau, que teve grande destaque nas últimas décadas do século XIX, quando o Soledade foi edificado, e primeiras décadas do século XX. O Art Nouveau enquanto escola artística valoriza o trabalho artesanal e possui fortes traços da natureza em sua arquitetura. Por isso, o arqueólogo, Fernando Marques, diz que o Cemitério Nossa Senhora da Soledade é: “Um museu a céu aberto”.

Nos dias atuais, o antigo cemitério ainda é cenário de tradicionais manifestações religiosas, como novenas, orações às almas e agradecimentos de graças alcançadas, ou mesmo atividades apenas contemplativas, face à predominância marcante de verdadeiras obras de arte presentes no Pórtico e nos Mausoléus. As catacumbas mais visitadas, e que se diz ser de almas que realizam milagres, é do menino Zezinho, falecido em 1881; da escrava Anastácia e da Preta Domingas, falecida em 1871. No entorno dessas sepulturas, velas, bombons, e flores são oferendas dos vivos à espera de milagres.





Além da religiosidade manifesta e típica do lugar, o cemitério revela uma visível segregação social que havia no século XIX. O tamanho dos mausoléus dos que tinham posses em relação às sepulturas dos escravos - que eram enterrados nos fundos do Soledade -, por exemplo, deixam claras as diferenças sociais da época. A presença das quatro irmandades: Santo Cristo (Da Santa Casa de Misericórdia), Ordem Terceira do Carmo e São Francisco da Penitência, revela também importantes fontes históricas da Cidade de Belém. As irmandades eram confrarias que recebiam doações em troca de sepulturas para que os doadores pudessem ser enterrados, no Cemitério da Soledade. Naquele tempo quem administrava os enterramentos nos cemitérios da cidade era a Santa Casa de Misericórida.

Outro aspecto interessante do cemitério é a sua extensão, que, então, ia desde a sua atual localização até onde hoje fica o colégio Instituto de Educação do Pará (IEP) e o prédio Manuel Pinto da Silva, ambos localizados à Avenida Serzedelo Corrêa, esquina com a Avenida Nazaré. “Não é raro para os moradores dessa região de Belém encontrar ossadas no quintal de suas casas”, afirma o arqueólogo do Goeldi. As escavações coordenadas por Marques serão realizadas até o mês de setembro, quando outras adaptações históricas e arquitetônicas serão realizadas no Soledade.

Sobre as importantes revelações históricas que as escavações no Cemitério Nossa Senhora da Soledade podem revelar, o arqueólogo responde: “Além de dados culturais, como objetos de uso pessoal, vestuário, formas de sepultamentos e informação, por exemplo, sobre saúde pública, a arqueologia pode resgatar simbolismos das práticas religiosas, oferendas, que muitas vezes não está publicada. O estudo arqueológico permite assim, confrontar estas fontes materiais com a documentação escrita”. As escavações realizadas por Marques e pela equipe que integra o projeto já encontraram várias peças de cerâmica, louças, metais e vidros, além de vestígios de pisos e construções de alvenaria de pedra e tijolos, feita com argamassada de cal obtida a partir de queima e trituração de conchas provenientes, possivelmente de sambaquis da região do salgado e das ilhas.





Arqueologia histórica em espaços urbanos – Esse será um dos temas tratados durante o I Encontro Internacional de Arqueologia da Amazônia, que acontece em Belém entre os dias 2 e 5 de setembro, no Teatro Maria Sylvia Nunes da Estação das Docas. A arqueologia histórica ocupa lugar de destaque no evento e a mesa sobre o tema tem coordenação do arqueólogo Fernando Marques, do Museu Goeldi, que também apresentará trabalho “Agroindústria canavieira e memória urbana: abordagens arqueológicas na Amazônia Colonial“.

Dentre os especialistas convidados estão Arno Kern,Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, e Marcos Albuquerque, da Universidade Federal de Pernambuco. Eles vão abordar a importância da arqueologia no contexto das cidades. Kern falará, especialmente, sobre o assunto no Período Colonial, e Albuquerque vai explorar a noção do potencial da arqueologia histórica para resgatar informações engolidas pelo passado, pela selva, em cidades varridas por ataques militares e doenças tropicais.

Já Paulo Zanettini, da Zanettini Arqueologia, apresentará trabalho relativo à arqueologia na cidade amazônica com dois estudos de caso – Projeto Arqueourbs, desenvolvido para o Governo do Estado do Amazonas e o Projeto Fronteira Ocidental, do Mato Grosso – a partir dos quais fará reflexões a respeito do papel do arqueólogo enquanto agente ativo na preservação do patrimônio ambiental urbano. “De aldeias a Missões religiosas: trocas culturais na foz do rio Amazonas“ é o título do trabalho que Paulo Roberto do Canto Lopes, do Museu Histórico do Estado do Pará apresentará durante a sessão.

O Encontro Internacional é uma parceria do Museu Goeldi com o Iphan e a Secretaria de Estado de Cultura do Pará (Secult), e conta com o patrocínio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Pará (Fapespa) e da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior ( Capes); e o apoio da Petrobras.

Serviço: I Encontro Internacional de Arqueologia Amazônica. Realização do Museu Paraense Emilio Goeldi, de 2 a 5 de setembro de 2008, na Estação das Docas, em Belém. Mais informações no portal do Museu Goeldi.


Fonte:

domingo, 4 de dezembro de 2011

Túmulos destruídos deixam ossadas a céu aberto em cemitério de Itu (SP)

Ocorre no hospital Pirapitingui, que foi um dos maiores leprosários do país.
Ação do tempo e vandalismo danificaram praticamente todos os túmulos.



Sepulturas quebradas, estátuas espalhadas pelo chão e mato alto formam o visual decadente do cemitério São José, que fica no interior do Hospital Pirapitingui, em Itu (Foto: Mayco Geretti/ G1)





Por Mayco Geretti. Do G1 Sorocaba e Jundiaí. Publicado 26/11/2011 18h31 - Atualizado em 26/11/2011 18h31 no site: http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/








O cenário é de devastação, ou mesmo de filme de terror. No cemitério São José, que fica dentro do Hospital Dr. Francisco Ribeiro Arantes, em Itu, praticamente não há túmulos inteiros. O cemitério existe desde a década de 1930, quando o hospital, conhecido como hospital-colônia Pirapitingui, foi inaugurado e passou a operar como um dos maiores leprosários do Brasil. A destruição do cemitério, causada pela ação do tempo e pelo vandalismo, deixa crânios e outros restos mortais a céu aberto.

Ao chegar ao Pirapitingui, a impressão é de se está entrando em um condomínio fechado. Na portaria, há vigias, mas a cancela é mantida aberta. Como existem mais de 200 pessoas vivendo no local – a maioria descendentes de doentes, o volume de visitantes é grande. É a zeladora quem orienta a reportagem sobre como chegar ao cemitério São José, onde estão enterrados centenas de ex-pacientes. Pelo trajeto, ruínas de grandes estruturas hospitalares e de convivência hoje abandonadas. Na época em que o Pirapitingui surgiu, portadores da hanseníase eram internados compulsoriamente por agentes de saúde para evitar o avanço da doença. Quando morriam, eram enterrados na área da unidade de saúde.



Ossadas, tufos de cabelos e restos de caixões são
encontrados a céu aberto. (Foto: Mayco Geretti/ G1)





O portão do cemitério é de madeira, com uma corrente sem cadeado fechando-o. Ao entrar, é fácil perceber o abandono. Cacos de esculturas de santos estão pelo chão e as tampas dos túmulos estão quebradas. Em várias delas é possível encontrar crânios, ossos do fêmur, tufos de cabelo e restos de caixões.

O vandalismo parece ser responsável pela maior parte dos danos, mas em alguns casos é nítido que invasores violaram seputuras à procura de objetos de valor, como dentes de ouro. Nestas, tijolos foram retirados, abrindo buracos por onde é possível passar o corpo de uma pessoa adulta.

Uma funcionária do hospital, que pediu para não ser identificada por temer represálias, afirma que quem pode, retira a ossada dos falecidos do local. "Famílias com mais dinheiro já levaram as ossadas de seus entes queridos para outros cemitérios. Esse clima de abandono espanta as pessoas. É raro aquelas que ainda visitam seus mortos. Acho que a dor por encontrar essa situação é tamanha que elas preferem nem voltar. Ver uma flor nova sobre uma das sepulturas é algo muito raro", afirma.

O G1 tentou contato com a diretoria do Pirapitingui neste sábado (26), mas foi orientado a procurar a assessoria de imprensa do Governo do Estado, responsável pela administração do hospital. Na capital, ninguém foi encontrado para falar a respeito.

No começo do ano a Secretaria de Estado chegou a informar que havia um projeto para que toda a estrutura do hospital fosse transferida à prefeitura de Itu, que poderia transformar o local em um bairro, mas até agora a iniciativa não saiu do papel.



Visitas de familiares ao São José são raras, segundo funcionários do Pirapitingui. A sensação ao passar por entre as sepulturas é de que ninguém frequenta o local há décadas. (Foto: Mayco Geretti/ G1)





Fonte: http://g1.globo.com/sao-paulo/sorocaba-jundiai/noticia/2011/11/tumulos-destruidos-deixam-ossadas-ceu-aberto-em-cemiterio-de-itu-sp.html

Veja também:
http://www.dgabc.com.br/News/5928935/cemiterio-de-leprosario-tem-ossos-a-ceu-aberto-em-sp.aspx

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Belém (PA): Abandono centenário degrada Cemitério da Soledade

Por Anderson Araújo (da Redação). Artigo publicado no jornal O Liberal (da cidade de Belém -PA), pág. 21, Seção Poder, de 13/11/2011. (clique na imagem ou salve no computador para ampliar)


terça-feira, 1 de novembro de 2011

Belo Horizonte (MG): Cemitério do Bonfim é tema de exposição no MHAB

Vista do Cemitério do Bonfim tendo ao fundo a cidade de Belo Horizonte. Imagem disponível em 01/11/2011 no site: http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/noticia.do?evento=portlet&pAc=not&idConteudo=51672&pIdPlc=&app=salanoticias




Notícia extraída da "Sala de Notícias" do Portal da Prefeitura de Belo Horizonte ( http://portalpbh.pbh.gov.br/ ) publicada em 17/10/2011 15:15:20.


O Museu Histórico Abílio Barreto exibe a exposição de curta duração “Descobrindo o Bonfim: o cemitério como lugar na cidade dos vivos”. Por meio de textos, fotos e objetos, a mostra propõe uma reflexão sobre o Bonfim para além do recinto onde se coloca a dor ou simplesmente o corpo sem vida, mas como lugar institucional, intersticial, portador de história, símbolo e arte e como parte importante da vida na cidade.

O Cemitério Nosso Senhor do Bonfim, denominado originalmente Cemitério Municipal, foi projetado pelos engenheiros-arquitetos Hermano Zickler, José de Magalhães e Edgar Nascentes Coelho, membros da Comissão Construtora da Nova Capital. Aberto em 1897, o local escolhido para a sua implantação, na região conhecida como Lagoinha, era alto e arejado, e a ocupação das quadras se deu a partir do prédio projetado para ser o necrotério.

Os mesmos artistas e artesãos cujas obras adornavam as edificações da cidade, em sua maioria imigrantes italianos, reproduziram nos túmulos e mausoléus a linguagem eclética dos edifícios da capital. Os materiais predominantes, até a década de 1920, foram o mármore e a pedra-sabão. A partir dessa época, o granito e o bronze também se fizeram presentes.

O nome Bonfim, que faz referência ao martírio de Jesus na cruz e simboliza proteção, passou a figurar em mapas, plantas e relatórios oficiais a partir da década de 1930. Foi escolhido pela população de Belo Horizonte e indica valores religiosos integrados ao imaginário social.

A exposição permanecerá em cartaz por um período aproximado de seis meses e pode ser visitada às terças, sextas, sábados e domingos, das 10 às 17h, e nas quartas e quintas, das 10 às 21h.


Fonte: http://portalpbh.pbh.gov.br/pbh/ecp/noticia.do?evento=portlet&pAc=not&idConteudo=51672&pIdPlc=&app=salanoticias

segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Acre: Cemitério abandonado esconde história da hanseníase no Juruá


"(...) cruzes cobertas de capim e lixo. Algumas ainda revelam nome dos hóspedes importunados, cujas memórias a cidade (Cruzeiro do Sul), segunda maior do Acre, tenta esquecer a qualquer custo."




Por Dilson Ornelas. Artigo publicado originalmente no site: www.vozdoacre.com e disponível desde 30 de Novembro de 2010 02:00 no site: http://www.vozdonorte.com.br de onde retiramos todas a fotos aqui postadas.


Hansenianos de Cruzeiro do Sul (AC), no Vale do Juruá, que tanto sofrimento e humilhação amargaram em vida, nem mesmo na morte conseguem o descanso a que teriam direito. O cemitério onde estão sepultados, no Bairro do Telégrafo, está tomado pelo mato e, em meio a ratos e cobras, transformou-se em esconderijo de traficantes e dependentes químicos. Os vizinhos pouco comentam o assunto e sequer chamam a polícia, temendo represarias de marginais.


Quanto ao abandono, o secretário municipal de Obras, Osmar Bandeira, afirma que a prefeitura é responsável pelos outros dois cemitérios da cidade, "mas de vez em quando alguns funcionários vão lá cortar o mato. Não se sabe quem são os responsáveis por aquele cemitério", declara Bandeira. Essa Reportagem apurou que eles não existem, e o cemitério que nem nome tem, não evita a discriminação contra os hansenianos, mesmo após a morte.




"No incômodo Campo Santo, sem muro e sem manutenção, uma pequena capela parcialmente destelhada é a testemunha mais antiga das cruzes cobertas de capim e lixo."



No incômodo Campo Santo, sem muro e sem manutenção, uma pequena capela parcialmente destelhada é a testemunha mais antiga das cruzes cobertas de capim e lixo. Algumas ainda revelam nome dos hóspedes importunados, cujas memórias a cidade, segunda maior do Acre, tenta esquecer a qualquer custo.


Uma das vizinhas do local invadido por desocupados pede para não ser identificada, e diz que "eles (os bandidos) arrombam os portões e entram nas casas, se os moradores se descuidam. Usam droga à noite, e às vezes até na luz do dia, porque isso aqui está largado há muitos anos". De acordo com ela, os moradores temem chamar a policia e sofrer alguma retaliação.


Completamente desconhecida pela população mais jovem, a pequena necrópole caiu no esquecimento de pessoas acima de cinqüenta anos. Moradora de um bairro próximo, Maria (o sobrenome é omitido propositalmente) não lembra mais a localização do cemitério. "Eu não sei onde fica, mas deve ser onde queriam enterrar meu marido", afirma a viúva. Ela diz que com a ajuda de amigos políticos, conseguiu enterrar o marido portador de hanseníase em outro lugar.


Mesmo ignorado pelo poder público, desconhecido da nova geração, e profanado por bandidos, o terreno com aproximadamente trinta covas aponta para um passado difícil de enterrar. A hanseníase que separou para sempre milhares de famílias, e como nos tempos bíblicos, também gerou repulsa e preconceito, ainda mostra seqüelas no corpo e na mente de pessoas curadas com a chegada de potentes medicamentos do governo.


Tem um cemitério no meio do caminho



O ex-prefeito e atual vice-governador Cesar Messias, de acordo com o vereador Celso Lima Verde, durante um período de obras tentou em vão remover o cemitério construído sobre a Rua Banjamin Constant, que liga os bairros do Telégrafo e Remanso. O juiz da época não permitiu e o jeito foi desviar a rua.


No tempo do leprosário Colônia Ernani Agrícola, havia outro cemitério com milhares de hansenianos enterrados, a maioria como indigentes, situado onde hoje está o Hospital Dermatológico. O vereador lembra que ainda aos 11 anos, ajudava nos sepultamentos. "Tinha dia que a gente enterrava até três pessoas". O bispo D. Henrique Ruth, com apoio do governo, ordenou que se retirasse dali todas as tumbas, para a construção do hospital.


Histórias de dor



Celso Lima Verde, aos 70 anos, recorda que foi retirado pela polícia à força de uma sala de aula, aos 9 anos de idade, quando descobriram que ele era hanseniano. Já em seu quarto mandato, mostra as mãos retorcidas pela doença.




Celso Lima Verde, aos 70 anos, recorda que foi retirado pela polícia à força de uma sala de aula, aos 9 anos de idade, quando descobriram que ele era hanseniano.





Celso fez parte do esforço para tentar dar dignidade e respeito a essas pessoas. Hoje, se locomove com ajuda da prótese que substitui um de suas pernas. E é admirado pela população não só por sua força de vontade, mas pelo bom-humor e pela facilidade com as palavras. Porém, Celso ainda vai às lagrimas quando fala do sofrimento que vivenciou.


"Naquela época não havia remédio para o tratamento da hanseníase, aí o médico Abel Pinheiro, ex-governador, receitava Melhoral (analgésico). À noite era uma gritaria muito grande. Não havia o que parasse a dor que a gente sentia, quando os nervos retorciam nossos dedos", lembra Celso, que precisa de uma prótese para se locomover.


Histórias tristes, carregadas de tanta dor, praticamente não interessam mais a ninguém em Cruzeiro do Sul, mas durante décadas o município foi cenário de um dos piores dramas de degradação do tecido social. Isso ocorreu em várias partes ao norte do Brasil e em países vizinhos ao Acre, como mostra o filme "Diários de Motocicleta", de Walter Salles. A película revela que, na década de 50, o médico argentino Ernesto Che Guevara, especialista em hanseníase, visitou leprosários na localidade peruana de Pucalpa, quase na fronteira com o Acre.


Novos casos


Em 2009 foram 44, e de janeiro a outubro deste ano foram localizados mais 12 novos casos da doença em Cruzeiro do Sul. Hoje o tratamento é eficiente e dispensa a internação, mas as péssimas condições de higiene e a desnutrição, que também favorecem ouras outras mazelas, até hoje continuam favorecendo os bacilos da hanseníase, em uma população abandonada pelo poder público.


Cerca de quatro mil sobreviventes ao flagelo da doença estão reintegrados ao convívio social em Cruzeiro do Sul, município de 79 mil habitantes. Alguns deles são comerciantes, e a maioria recebe alguma aposentadoria. Na opinião do vereador, somente um quarto dos hansenianos dos internos daquela época, era de cruzeirenses, a grande maioria vinha de outros municípios do Acre, e até do Amazonas.


A Secretaria Municipal de Saúde continua contabilizando novos casos, principalmente nas ocasiões de busca ativa. Às vezes aparecem doentes já em estado avançado da doença, moradores de locais de difícil acesso, com seqüelas irreversíveis.

Fonte: http://www.vozdonorte.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=131:cemiterio-abandonado-esconde-historia-da-hanseniase-no-jurua-&catid=47:meio-ambiente&Itemid=63




quinta-feira, 18 de agosto de 2011

Memórias e saudades divididas onde a história jaz

Cemitérios de São Leopoldo remetem a saudades, mas também ajudam a contar história do Município.
Memórias e saudades divididas onde a história jaz. Foto: Adriana Tauchert/Da Redação. Imagem disponível em 18/08/2011 no site:http://www.diariodecanoas.com.br/regiao/225688/memorias-e-saudades-divididas-onde-a-historia-jaz.html



Por Adriana Tauchert/Da Redação. Artigo publicado no Diário de Canoas - Vale dos Sinos - Região - 31/10/2009 11h30 Atualizado em 10/04/2011 22h28

São Leopoldo [RS]- Entre as lápides e jazigos dos cemitérios de São Leopoldo repousam muito mais do que entes queridos. Nestes locais que nos remetem a sentimentos como a saudade e a dor, também estão as origens do Município. Nos falta, em geral, esta consciência de que os cemitérios podem nos revelar a memória da cidade, do povo, das famílias que ajudaram a criar e desenvolver o Vale do Sinos. Locais de reflexão e culto, os cemitérios guardam nossa história, a qual, poucos reverenciam de fato.

Em São Leopoldo há controvérsia quando o assunto é saber qual foi o primeiro cemitério da cidade no século 19. Sem um registro oficial e exato, restam os indícios. Conforme o historiador Germano Moehlecke, o primeiro cemitério foi o da Feitoria, hoje denominado Cemitério Municipal Pedro Carlos Becker. Já a administradora dos cemitérios municipais, Ermelinda Camargo acredita que o mais antigo é o Cemitério Municipal Cristo Rei.

Conforme Moehlecke, o da Feitoria deve ser o primeiro por estar localizado próximo à Casa do Imigrante, casa que abrigou os primeiros 39 imigrantes alemães que chegam ao Município em julho de 1824. "No pátio da própria Casa do Imigrante há cerca de dez túmulos antigos de pessoas que viveram, não só em São Leopoldo, mas de outras cidades da região como Estância Velha.’’

Indícios - Registros para comprovar datas não há. "Em 2001, um incêndio destruiu todos os documentos, inclusive fichas de pessoas sepultadas e cadastros de terrenos do Cristo Rei’’, conta a coordenadora dos cemitérios. Até a data do incêndio, os documentos ficavam guardados em uma construção no próprio cemitério. Os documentos posteriores ao incidente passaram a ser guardados na administração dos cemitérios municipais de São Leopoldo. O Cartório de Registros começou suas atividades em 19 de setembro de 1876 e nesta época os enterros já ocorriam no Cristo Rei, que hoje conta com cerca de 22 mil corpos sepultados.

Moehlecke diz que cerca de dois anos após o início da imigração, foi criado outro cemitério além do da Feitoria, na região onde hoje se localiza a Escola Municipal Villa Lobos, no Centro. "Mas não tenho conhecimento de que existem registros sobre a sua história e dados sobre o primeiro corpo a ser enterrado."

Registros dizem que mortos foram lançados ao mar
O professor de Pós-Graduação em História da Unisinos, Martin Dreher, acredita que o primeiro cemitério de São Leopoldo foi o da Feitoria. "O Cemitério da Feitoria é anterior à imigração. Mas não há mais sepulturas daquela época. Nele devem ter sido enterrados escravos e pessoas da Feitoria do Linho e Cânhamo’’, conta Dreher, que no início deste ano começou a pesquisa Os Cemitérios da Colônia Alemã.

Os primeiros registros da Comunidade Evangélica apontam que em 1830, um comerciante, Jacob Riehl, com 36 anos, foi sepultado neste cemitério. Mas as anotações começaram seis anos antes, ainda em 1824. O primeiro registro, por exemplo ocorreu ainda no navio, na segunda leva dos imigrantes alemães. Foi o de Pauline Dorothea Germania Jericke, evangélica, nascida em 29 de junho de 1824 e falecida em 4 de agosto do mesmo ano. Diz no registro que o corpo foi lançado ao mar, às 14 horas, inclusive com detalhes sobre a latitude e longitude.

Também o sapateiro Johann Springer, católico, que faleceu em 29 de agosto de 1824 foi lançado ao mar. Os registros foram feitos porque havia um pastor entre os imigrantes: Johann Georg Ehlers. Muitos registros posteriores não falam em local do enterro, mas chamam atenção pelo grande número de crianças.
Dreher diz que depois do cemitério da Feitoria surgiu o da vila, onde hoje é a Escola Villa Lobos. "Eu desconfio que as palmeiras que hoje estão lá são remanescentes daquela época. No local, o lado esquerdo era para enterrar os evangélicos e o direito para os católicos. Ele foi extinto devido a uma epidemia de cólera e tifo, sendo os corpos levados para fora da cidade onde hoje é o Cristo Rei.’’

Uma valiosa fonte de pesquisa
Para o historiador do Museu Histórico Visconde de São Leopoldo, Marcos Antônio Witt, o cemitério é uma fonte de pesquisa valiosa. Ele buscou em túmulos e lápides dados de genealogia para o seu livro Em busca de um lugar ao sol: Estratégias Políticas, lançado no ano passado. "Nos cemitérios é possível encontrar informações como datas de nascimento e de morte da pessoa. Em papéis as informações se perdem.’’

O historiador ressalta que é possível obter informações sobre a organização social de um grupo. "Há desde túmulos elaborados até outros bem simples. O grau de sofisticação do túmulo e a própria localização dão uma ideia do prestígio que a pessoa teve.’’ Witt buscou informações sobre em cinco cemitérios, entre eles da Feitoria, de Novo Hamburgo, Estância Velha e Três Forquilhas.


Conservando nossa memória
Conforme o historiador Germano Moehlecke, a conservação dos cemitérios é importante para o Município porque resgata a memória da cidade, além de ser uma forma de demonstrar respeito aos precursores. No Cemitério Municipal de São Leopoldo, por exemplo, entre outros nomes importantes, está o túmulo do médico e vice-diretor da Colônia Alemã de São Leopoldo, João Daniel Hillebrand, que veio na segunda leva de imigrantes em novembro de 1824; dos prefeitos Theodomiro Porto da Fonseca, Mário Sperb, Maria Emília de Paula, deputados estaduais Jorge Germano Sperb, Othon Blessmann e Frederico Guilherme Schmidt que fizeram parte da história do Município e hoje são homenageados pelo seu trabalho dando nome a ruas, avenidas e escolas.


Foto: Carlos Félix/GES


FONTE:http://www.diariodecanoas.com.br/regiao/225688/memorias-e-saudades-divididas-onde-a-historia-jaz.html

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Os animados cemitérios medievais

As necrópoles já foram um bom lugar para morar, namorar, jogar bola, dançar, comer, beber e fazer compras. A vida social entre túmulos chegou a tal nível de efervescência que a Igreja passou a legislar sobre o uso do espaço



Entre os túmulos, jovens formavam alegres e ruidosas rodas de dança/Farândola, ilustração de manuscrito, autor desconhecido, séc. XI. Acervo:BIBLIOTECA MUNICIPAL DE POITIERS



Por Séverine Fargette-Vissière. Reportagem publicada na edição nº67 de Maio de 2009 na Revista HISTÓRIA VIVA [http://www2.uol.com.br/historiaviva/].






Os cemitérios da Idade Média nada tinham de tenebroso. De dia ou de noite, era neles que a população das maiores cidades européias buscava se divertir, quando não fixar residência provisória ou definitiva. Além disso, as necrópoles eram também um espaço de cidadania, pois lá sempre estavam juízes a comunicar sentenças, e o equivalente aos prefeitos de hoje a dar publicidade a suas ações. Esses locais funcionavam ainda como cartórios a céu aberto. Não que as condições ajudassem, pois já havia acúmulo de corpos e problemas de higiene e limpeza. Mas, de fato, os cemitérios atraíam. Eram um componente da urbanidade de então, construída através dos séculos e com origens bastante remotas.

Na Antigüidade romana, os mortos eram enterrados fora da cidade, na beira de estradas ou em vastos espaços subterrâneos, as catacumbas. Com a cristianização da sociedade, surgiu a tendência a aglomerar os defuntos nas proximidades dos lugares sagrados, como tumbas de santos e igrejas, na expectativa do Juízo Final e da ressurreição dos corpos.

Assim se definiu um espaço sagrado, quadrangular e fechado: o átrio ou adro no terreno das igrejas. Com isso, a morada dos mortos passou a ser o centro das cidades e aldeias, num estreito convívio com os vivos.

Nas pequenas cidades medievais, cercadas de muralhas, os cemitérios tinham o poder de atrair as pessoas e, por isso, não surpreende que tenham assumido uma função principalmente religiosa. Era no espaço cercado em que se enterravam os defuntos que os vivos ouviam as palavras dos padres e recebiam sacramentos. A igreja era muito pequena para acolher a massa de fiéis e, além disso, a pregação entre os mortos impressionava mais os espíritos.



Desfiles da monarquia terminavam nos átrios de igrejas/ Procissão das relíquias de Luis IX, ilustração de manuscrito, cardeal-mestre Bourbon, séc. XIII. Acervo: BIBLIOTECA NACIONAL DA FRANÇA, PARIS.




Os pregadores itinerantes também gostavam de se instalar nos átrios a fim de lembrar aos vivos a sua aterrorizante natureza mortal e exortá-los ao arrependimento. Além disso, certas cerimônias tinham naturalmente por cenário a morada dos mortos: a de Finados e a missa de Ramos, que dá início à celebração da paixão e morte de Jesus. Daí para o local se tornar ponto de partida ou de chegada de outras grandes celebrações, procissões e peregrinações não custou muito.

O cemitério foi se tornando, assim, o lugar ideal para toda reunião pública, religiosa ou laica. Na Idade Média, tornou-se o local de escolha para que o prefeito informasse seus aldeões de suas medidas. As chamadas “barras do tribunal”, grade ou cerca que separa o juiz do público e do acusado, também eram instaladas nesses pátios das igrejas.

Foi no cemitério de Rouen, na França, que o tribunal eclesiástico julgou Joana d’Arc, por exemplo. Os inquisidores, embora interrogassem secretamente as suas vítimas, pronunciavam a sentença publicamente num estrado erguido no cemitério. Mesmo os atos de direito privado, como doações, vendas e trocas, eram tornados públicos no cemitério. Alguns atos jurídicos chegavam a associar os mortos aos vivos: um costume disseminado na Bélgica previa que uma viúva podia se livrar de dívidas mediante uma cerimônia em que depositava no túmulo do marido “a sua cinta, as suas chaves e a sua bolsa”.

Também era na necrópole que se pronunciava a pavorosa sentença de “morte civil” dos leprosos, cerimônia que copiava fielmente os ritos fúnebres. Expulsavam-se os leprosos da comunidade dos viventes, entregando-lhes os instrumentos de sua nova condição: as luvas, a gamela e a barulhenta matraca, com que anunciavam sua passagem para que as pessoas sãs se afastassem.






Velórios eram um entre dezenas de usos dos campos-santos/Enterro em átrio de igreja medieval, iluminura, Gillion de Trazegnies, séc. XIV, França. REPRODUÇÃO





Muitos desses costumes perduraram até o século XVIII. Só no século XIX, as reuniões e os anúncios públicos migraram para as prefeituras. Mas nem sempre a Igreja viu essas reuniões com bons olhos. Chegou a tentar proibi-las a partir do século XII, sem sucesso. Convém lembrar, contudo, que se tratava mais de conflitos entre a autoridade religiosa e a laica do que propriamente de preocupação com o respeito aos mortos.

De fato, o cemitério extrapolou tanto sua finalidade original que, em dado momento, se tornou um lugar de comércio muito freqüentado. Lá se encontravam bancas de “carniceiro” – como eram chamados os açougueiros –, lojas e até mesmo tabernas.

Os comerciantes gostavam da localização, isenta de alvarás e impostos e com constantes reuniões populares, o que garantia freguesia variada. Nos dias de peregrinação, improvisavam- se mercados e feiras. O comércio de bebidas se multiplicou. Os taberneiros fincavam sua tabuleta e não vacilavam em cavar porões para conservar os tonéis de vinho e cerveja naquele solo repleto de ossadas.

Em 1402, Paris proibiu os comerciantes de expor mercadorias sobre os túmulos. Em vão. Até o século XVIII, as lojas se alinhavam no cemitério dos Inocentes, tanto que se falava no “ossário dos vendedores de roupa” e no “ossário dos escreventes”. Um viajante descreveu esse lugar incrível, no qual se via “uma fila dupla de lojas de escreventes, de vendedores de roupa, de livreiros e de mercadores de panos. (...) Em meio a essa confusão, procedia-se à exumação, abertura de um túmulo para substituir cadáveres ainda não totalmente consumidos”.




A Via Ápia, estrada onde se instalavam as necrópoles na Antigüidade romana. Foto: CREATIVE COMMONS



Embora não se importasse com a proximidade dos defuntos, o público se queixava dos fétidos odores que o chão exalava e das escavações que muitas vezes revelavam corpos mais ou menos descarnados. Entretanto, os europeus e os viajantes estrangeiros aglomeravam-se nos cemitérios com interesse e curiosidade.

Só não era recomendado passar a noite no local. O escritor renascentista François Rabelais registrou que “pedintes, mendigos e miseráveis” lá vadiavam, sem contar os condenados foragidos da lei. Os campos-santos, tal como concebidos nos tempos medievais, tinham uma reputação tão detestável que o humanista concluiu que Paris era “uma boa cidade para viver, mas não para morrer”.

CULTIVO DE ALIMENTOS Os artesãos e os comerciantes não eram os únicos a assediar os cemitérios europeus. Alguns pareciam jardins, pois foram dotados de árvores e arbustos floridos, escolhidos a dedo para favorecer a prece e a contemplação. Outros, possivelmente concebidos de forma mais pragmática, se transformaram em espaços agrícolas arados e semeados, nos quais se produziam cereais e legumes.

No século XI, a cevada era abundante no cemitério Saint-Gervais, na França. Na região da Normandia, a igreja chegava a condenar a população caso os cemitérios não fossem cultivados. Em diversos casos, era necessário cavar um poço ou providenciar outra forma de abastecimento de água. Tais atividades agrícolas às vezes geravam conflitos entre os fiéis, as autoridades religiosas e as laicas, envolvendo a cobrança de taxas sobre as colheitas.






O que restou do cemitério medieval inglês The East Smithfi eld Black Death. Foto: MUSEUM OF LONDON ARCHAEOLOGY




No fim da Idade Média, a Igreja romana legislou para expulsar todas as atividades que perturbassem a quietude dos lugares. Foi proibida a venda de pão, aves, A Via Ápia (à esq.), estrada onde se instalavam as necrópoles na Antigüidade romana peixes e outras mercadorias, com exceção de velas.

A Igreja também passou a condenar as atividades lúdicas, pois os jovens passeavam e namoravam nos cemitérios. Como se não bastasse, eles ainda jogavam bola, cortejavam as moças à sombra dos ossários e dançavam entre os túmulos a farândola, uma dança medieval muito popular, em que vários participantes fazem uma roda, que evolui para outras formações.

Na segunda metade do século XII, um sacerdote de Liège, na França, reclamou dos fiéis que, todos os domingos e dias santos, “freqüentam os mimos, as dançarinas, os histriões, embriagam-se e se rendem ao jogo, assistem ou se misturam à dança sedutora das mulheres, entregam-se a cantos obscenos e a posturas impudicas diante da porta das igrejas e sobre o túmulo dos pais”. Novas tentativas de proibição, porém, fracassaram.

Os cemitérios se tornaram também lugar de refúgio. Em tempo de guerra, os aldeões lá se abrigavam, às vezes com todos os seus bens. Quando os conflitos perduravam, eles organizavam pequenos quartos por cima dos ossários ou construíam casas ao longo da cerca. O gado pastava, já que o capim grassava ao redor dos túmulos, e acumulava em toda parte montes de estrume. Em tempos de insegurança, os túmulos também serviram como esconderijo de bens dos habitantes de algumas localidades.



Joana d´Arc foi julgada num cemitério, em sessão pública/ Joana D’arc na fogueira, pintura, E. Lenepveu, 1889, Panteão de Paris, França. Acervo: MUSEU JULES-EUGÈNE LENEPVEU, PARIS.




Por vezes, a função de refúgio chegava a anular a principal vocação do campo-santo: no século XII, um bispo, por solicitação dos habitantes da cidade francesa de Redon, fundou um cemitério em que não se admitiam cadáveres. Tratava-se de um espaço abençoado “para refúgio dos vivos, não para sepultura dos mortos”. Mas essa decisão exasperou os monges locais que lá queriam ser enterrados e acabaram obtendo ganho de causa.

Na verdade, a segurança dos cemitérios os transformou em lugares habitados. O Concílio de Troyes, do ano 878, já determinava que os que ousassem arrombar igrejas ou roubar as casas situadas no recinto dos cemitérios cometiam um grave sacrilégio. O problema é que os refugiados por vezes se sentiam tão bem em espaço protegido que tendiam a se fixar, e os clérigos não conseguiam expulsá-los.

Não raro, os padres também ocupavam essas vivendas ou tratavam de lucrar alugando pequenos lotes. Nesses períodos, os vivos chegavam a desalojar os mortos, pois as casas invadiam todo o espaço e já não era possível enterrar ninguém. De tempos em tempos, a Igreja cuidava de colocar ordem na ocupação, mas sem reduzir o interesse dos inquilinos.Curiosamente, o cemitério chegou a ser um lugar cobiçado: lugar sagrado, aluguel barato e imunidade contra abusos da polícia eram condições atraentes.

Existia ainda uma categoria particular de habitantes permanentes: as reclusas. Mulheres que, por espírito de devoção, se deixavam confinar vivas em casinhas apoiadas na igreja do cemitério. Bem acomodadas, algumas chegavam a uma longevidade excepcional. Foi assim que, em 1470, o rei Luís XI decidiu homenagear uma tal Alix la Bourgotte, que falecera depois de ter passado 46 anos reclusa no cemitério dos Inocentes. Na mesma época, outras mulheres lá foram confinadas, se bem que a contragosto, como certa Renée de Vendômois, condenada à prisão perpétua pelo assassinato do marido.



A área de sepultamentos em Paris, bem no meio da cidade Cemitério dos Inocentes, gravura, autor desconhecido, século XVIII. REPRODUÇÃO



Nem sempre, porém, o cemitério medieval foi seguro. Alguns combates entre inimigos locais chegaram a ocorrer, como violentas brigas de vizinhos e duelos. Ademais, quando faltava vigilância, o cemitério tendia a se transformar rapidamente em depósito de lixo, outro desafio que a Igreja tentou enfrentar com proibições e pragas – dizia que os que urinavam ou defecavam nos túmulos seriam acometidos por doenças.

Mais difícil, porém, era lutar contra os animais, os porcos soltos que tendiam a fuçar a terra, desenterrando os cadáveres, e os cães que urinavam e cavavam por toda parte. No cemitério dos Inocentes, em Paris, um dos raros monumentos de pedra tinha a imagem de Nossa Senhora e a inscrição de um homem que “em vida se gabava de que os cães não urinariam em seu sepulcro”.

Seria preciso aguardar o século XIX e o uso generalizado das lajes sepulcrais para que os cemitérios se tornassem um espaço silencioso e cercado de altos muros, rigorosamente reservado aos defuntos, uma verdadeira necrópole ou cidade dos mortos, que só se anima no Dia de Finados.




Séverine Fargette-Vissière é historiadora especializada em estudos medievais




OBSERVAÇÃO: Todas as imagens constam da reportagem cujo link segue abaixo e que ali encontravam-se disponíveis em 08/08/2011.




Fonte: http://www2.uol.com.br/historiaviva/reportagens/os_animados_cemiterios_medievais.html

sexta-feira, 29 de julho de 2011

Rio de Janeiro: Iphan tomba mausoléu de Santos Dumont

O Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) tombou provisoriamente o Mausoléu Ícaro, que abriga os restos mortais de Santos Dumont (1873-1932), no Cemitério São João Batista, em Botafogo, zona sul do Rio. "É um dos mais procurados, ao lado do de Cazuza, Carmen Miranda, Clara Nunes e Chacrinha", diz o funcionário da Santa Casa Ideraldo da Silva Abreu, de 52 anos, que há 15 trabalha no cemitério.






Mausoléu Ícaro, que abriga os restos mortais de Santos Dumont (1873-1932), no Cemitério São João Batista, em Botafogo, zona sul do Rio. Imagem disponível em 29/07/2011 no site: http://jornaldecaruaru.wordpress.com/2011/07/16/iphan-tomba-mausoleu-de-santos-dumont/



Por AE Agência Estado. Notícia postada em 16/07/2011 às 8h 40 no ESTADÃO.COM.BR



Se for ratificado pelo Conselho Consultivo do órgão, será o primeiro tombamento desse tipo no Estado do Rio. "Trata-se de uma formalidade. Não conheço nenhum caso de tombamento provisório que não tenha sido seguido pelo conselho", diz o superintendente do Iphan no Rio, Carlos Fernando Andrade.





[Detalhe do] Mausoléu de Santos Dumont, no Cemitério São
João Batista, foi tombado provisoriamente pelo
Iphan (Foto: Fábio Motta/AE).
Imagem disponível em 29/07/2011 no site:
http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2011/07/mausoleu-de-santos-dumont-no-rio-e-tombado-provisoriamente-pelo-iphan.html



Vizinho de jazigos simples como o de Tom Jobim (1927-1994) e Luiz Carlos Prestes (1898-1990), o monumento chama a atenção. Protegido pela copa de uma árvore, é composto por um pedestal em pedra e uma escultura em bronze, no topo, de aproximadamente três metros, da figura mitológica de Ícaro. Está bem conservado.



[Vista geral do] Mausoléu Ícaro [que] está localizado no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro / Foto: Fabio Motta/AE [tirada em 15/07/2011 às 17:32hs]. Imagem disponível em 29/07/2011 no site: http://www.band.com.br/noticias/cidades/noticia/?id=100000444409



"Este jazigo que mandei construir para última morada de meus pais, junto dos quais desejo vir descansar, é cópia do monumento levantado em um arrabalde de Paris, em 1913, pelo Aero Club da França", anuncia uma placa assinada por Santos Dumont. Segundo o Iphan, a obra original é de autoria de George Colín e foi produzida para homenagear o inventor brasileiro. A reprodução que se encontra no cemitério foi usada na exposição internacional em Comemoração ao Centenário da Independência, em 1922. Ao término do evento, Santos Dumont foi presenteado com a escultura.





O aviador [Santos Dumont] em foto de 1924 quando estava com 51 anos. Acervo: Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica - INCAER. Imagem disponível em 29/07/2011 no site:http://aprendebrasil.com.br/especiais/14bis/popFoto.asp?idFoto=47&qtde=70&idPerna=



Mausoléu de Santos Dumont [recebendo homenagem] no Cemitério São João Batista, no Rio de Janeiro. Acervo: Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica INCAER. Imagem disponível em 29/07/2011 no site:http://aprendebrasil.com.br/especiais/14bis/popFoto.asp?idFoto=53&qtde=70&idPerna=



Outro aspecto do Mausoléu em foto antiga onde se lê na legenda: Sôbre o túmulo de seus pais, onde também repousa, Santos-Dumont colocou uma reprodução do "Ícaro" de Saint Cloval. Acervo: Instituto Histórico-Cultural da Aeronáutica INCAER. Imagem disponível em 29/07/2011 no site:http://aprendebrasil.com.br/especiais/14bis/popFoto.asp?idFoto=54&qtde=70&idPerna=


Administrado pela Santa Casa de Misericórdia, o São João Batista foi inaugurado em 1852. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

FONTE: http://www.estadao.com.br/noticias/geral,iphan-tomba-mausoleu-de-santos-dumont,745752,0.htm

sexta-feira, 22 de julho de 2011

Ossos do ofício

Mesmo sem ajuda de órgãos públicos, casa onde foi descoberto cemitério de escravos vira centro cultural.


Visão aérea atual da região onde ficava o cemitério. Imagem disponível em 22/07/2011 no site: http://www.revistadehistoria.com.br/secao/em-dia/ossos-do-oficio




Por Cristina Romanelli. Artigo publicado na Seção "Em Dia" da Revista de História da Biblioteca Nacional, Edição Nº 70, página 10, de [06 de] Julho de 2011.




Enquanto fazia obras em sua casa, no bairro da Gamboa, Centro do Rio de Janeiro, um casal achou vários ossos enterrados no chão. Logo surgiu a suspeita de que poderia ter ocorrido uma chacina no local, e até a polícia entrou na história. Arqueólogos resolveram o mistério: ali havia um cemitério com milhares de escravos recém-chegados da África, os chamados pretos novos. Por conta própria, os donos da casa criaram o Instituto de Pesquisa e Memória Pretos Novos (IPN), que no ano passado ganhou o Prêmio Rodrigo Melo Franco de Andrade, do Iphan. Agora eles vão transformar a casa ao lado em um memorial para contar a história do cemitério e organizar exposições e eventos.

Segundo o historiador Julio César Medeiros, autor de A flor da terra: o cemitério dos pretos novos no Rio de Janeiro (Garamond Universitária, 2007), muitos dos africanos recém-chegados morriam vitimados pela varíola, doença que só se manifestava durante a viagem para o Brasil. Por muito tempo eles foram enterrados junto a outros escravos e brancos indigentes, mas em 1779 ganharam um espaço próprio na Gamboa. “Este é o único cemitério criado para pretos novos de que se tem notícia. Outros cemitérios, como o Campo da Pólvora, na Bahia, tinham até presos”, conta Medeiros.

Desde que os ossos foram recolhidos pelo antigo Departamento Geral de Patrimônio Cultural (hoje Subsecretaria do Patrimônio Cultural, Intervenção Urbana, Arquitetura e Design), em 2006, a prefeitura não fez mais nenhum trabalho no local. “Eles chegaram a dizer que iam começar as escavações em 2001, mas acho que o projeto não foi aprovado. Não nos disseram nada e nem voltaram mais. Como não somos historiadores, temos dificuldade para tocar isso aqui, mesmo com a ajuda de alguns estudantes e pesquisadores”, conta Merced Guimarães, dona da casa.

Os ossos foram levados para o Instituto de Arqueologia Brasileiro e estão sendo estudados por várias instituições, entre elas a Fundação Oswaldo Cruz. “Temos dois estudos sobre os dentes dos escravos que vão sair agora no segundo semestre. Fiz uma palestra sobre um deles em Minneapolis, nos Estados Unidos. Há interesse internacional pelo assunto”, diz Sheila Mendonça de Souza, pesquisadora da Fiocruz.

Enquanto o material está sendo estudado, a prefeitura continua sem planos muito definidos para o cemitério. Segundo a Subsecretaria de Patrimônio, há um projeto de integração urbanística entre diversos pontos históricos da região, como o Cais do Valongo, mas a inclusão do cemitério não é certa. Mesmo sem ajuda de custo, o IPN pretende finalizar as obras em sua sede ainda este mês, em seguida fazer uma exposição que conta a história dos pretos novos e inaugurar uma sala multimídia e um espaço para mostras temporárias. O instituto também abriu espaço para a equipe do Museu Nacional (UFRJ) fazer algumas escavações e, quem sabe, novas descobertas.

Saiba Mais - Internet

Portal Arqueológico dos Pretos Novos:






sexta-feira, 3 de junho de 2011

''Polacas'' do Rio ganham nome em cemitério

Criado em 1916 por prostitutas polonesas, local polêmico passou anos esquecido.



Inhaúma. Cerca de 95% dos túmulos já estão identificados no local, que foi tombado pela prefeitura carioca em outubro do ano passado [2010]. Foto Fabio Motta/AE


Por Felipe Werneck / RIO - para o jornal "O Estado de S.Paulo" publicado em 18 de maio de 2011 0h 00 no site:http://www.estadao.com.br/



A porta está trancada, o repórter toca a campainha e é recebido pela funcionária que cuida da limpeza do Cemitério Israelita de Inhaúma, na zona norte do Rio. "É muito difícil vir alguém aqui", ela comenta. "Não é igual a um cemitério comum. Ninguém visita as polacas." Fundado em 1916 por imigrantes polonesas marginalizadas por serem prostitutas, o local abriga cerca de 800 túmulos. Após décadas de deterioração e esquecimento, as sepulturas começaram a ser reformadas no ano passado. Segundo o presidente do Cemitério Comunal Israelita do Caju, Jayme Salomão, que também administra o de Inhaúma, 95% dos túmulos já estão identificados. Além da pintura, eles receberam placa branca de mármore com estrela de Davi no centro, o nome de quem está ali sepultado, a data do óbito e o número que representa na cronologia do cemitério.

Não houve divulgação. A iniciativa ocorre 15 anos após a polêmica suscitada pela publicação do livro Baile de máscaras: mulheres judias e prostituição. As polacas e suas associações de ajuda mútua (Editora Imago), fruto de dissertação de mestrado da historiadora Beatriz Kushnir, atual diretora do Arquivo Geral da Cidade.

Segundo ela, em 27 de outubro o prefeito Eduardo Paes assinou decreto determinando tombamento definitivo do cemitério. Segundo o documento, "quaisquer intervenções físicas deverão ser previamente aprovadas pelo Conselho de Proteção do Patrimônio Cultural". Nas justificativas do decreto, o local é considerado "marco particular no âmbito dos campos santos da cidade por ter sido criado por mulheres que, em um ambiente hostil, se uniram para garantir sua sobrevivência". Um dos objetivos da decisão foi justamente "garantir a essas mulheres uma memória que não as condene eternamente".

Salomão atribui a demora ao "trabalho minucioso" para levantar os nomes e diz que foram gastos R$ 300 mil na reforma. Agora, ele pretende investir "mais R$ 1 milhão" em um polêmico "projeto de revitalização". Para isso, vai pedir à prefeitura a reativação do cemitério. O objetivo é que a eventual venda de novos túmulos gere receita para bancar a manutenção. Cerca de metade do terreno está livre, avalia.

Salomão insiste na ideia - criticada por Beatriz - de separar os túmulos das polacas por "cerca viva". "É para preservar a história do passado sem chocar. Se juntar tudo, quem for ao cemitério não vai entender nada." Segundo ele, a cerca receberia plantas de 30 a 50 centímetros. Seria uma forma de atender à ala judaica mais ortodoxa, que defende enterro de prostitutas e suicidas junto ao muro de cemitérios. Salomão nega. Segundo ele, a ideia é "criar um museu vivo". "Hoje, aquilo fica fechado o ano inteiro. Queremos que os túmulos sejam visitados. É um lugar sagrado. O objetivo é preservar."

Sítio histórico. Para Beatriz, trata-se de tentativa de "expurgo" da memória dessas mulheres. "Eles podem fazer tudo o que for necessário apenas para manter como sítio histórico. Não podem fazer mais nada para enterrar outras pessoas." Localizado na Rua Piragibe, 99, o cemitério fica colado na Favela do Rato Molhado. "Tem milícia ali. Tirando eu, duvido que outro judeu queira ser enterrado lá", diz Beatriz.

Vice-presidente da Federação Israelita do Estado até novembro e presidente da sinagoga Beyruthense, Salomão reconhece que há preconceito entre representantes da comunidade judaica, mas afirma que não há respaldo institucional para isso. "Pode ser que algumas pessoas, sim, mas eu acredito que não exista preconceito. Se existisse, não falaríamos em reativação do cemitério. A ideia da revitalização é dar continuidade."

A historiadora defende arborização e preservação do local como está. Para ela, a reforma foi uma vitória. "Mas fico com pena de não ter sido como em São Paulo (veja ao lado), onde a comunidade judaica foi muito participativa, não se fez nada às escondidas, houve inauguração das lápides. Aqui tem muito mais caráter de imposição por circunstâncias do que vontade própria."

O livro de Beatriz contabiliza 797 sepulturas. Na ocasião - a dissertação foi defendida em 1994 e o livro, lançado dois anos depois -, ela localizou duas descendentes de polacas. "Muitos não sabem ou preferem não se meter nisso", conta. Segundo a Federação, foram localizadas 807 durante a reforma. Criado a partir de um modelo associativo, o cemitério de Inhaúma abriga corpos de mulheres, homens e crianças. "Não é porque foram prostitutas que elas não eram casadas. E não necessariamente o marido era cafetão; elas também eram cafetinas (donas de prostíbulos)", explica Beatriz.

FONTE: http://www.estadao.com.br/estadaodehoje/20110518/not_imp720662,0.php


terça-feira, 24 de maio de 2011

Santa Catarina: Grupo faz inventário de cemitérios da Vila Itoupava em Blumenau

Intenção foi de fotografar 1.567 sepulturas e catalogá-las com informações básicas sobre os sepultados


Túmulos podem ser tombados como patrimônio cultural. 10/05/2011 Foto: Rafaela Martins/Agencia RBS.



Por Cristian Weiss (cristian.weiss@santa.com.br) Artigo publicado no Diário Catarinense on line (http://www.clicrbs.com.br/diariocatarinense/jsp/default.jsp?uf=1&local=1&section=capa_online ) Seção Geral 10/05/2011 21h37min



Era março de 1928. O sol ardia no final do verão sobre as colinas da Vila Itoupava. O lavrador Otto Pagel queria somente cavar um poço para extrair água fresca e aliviar o calor da família. Enquanto nada vertia do poço, Otto tomou o leite que ordenhara da vaquinha da família no dia anterior para aliviar a sede.

Coalhada, a bebida, combinada ao calor, lhe fez mal. A família tentou levá-lo a um médico, difícil de encontrar por aquelas terras. Otto não resistiu. Morreu dia 31, aos 29 anos. A partida ocorreu quatro meses após perder o pai, Milh. Desde então, pai e filho descansam eternamente e compartilham, lado a lado, a mesma sepultura no Cemitério Itoupava Rega I.

O local é um dos seis cemitérios da Vila Itoupava inventariados pelo Projeto Lugares de Antepassados, Lugares de História. A primeira apresentação pública do estudo, feito em parceria com a Fundação Cultural de Blumenau, ocorre hoje, no Cemitério da Rua São José. Imponente, a cabeceira que abriga os epitáfios da década de 1920 da família Pagel foi feita em concreto e talhada à mão. Sete colunas de cimento circundam as covas, interligadas por correntes de ferro.

Uma obra-prima que demonstra o esmero da família pelos dois pioneiros da Vila Itoupava que se foram. O túmulo dos Pagel se destaca, mas divide espaço com outras lápides antigas, onde foram sepultados imigrantes alemães e os primeiros a ocupar a região das Itoupavas. O cemitério ainda está ativo, mas os novos túmulos, feitos em mármore comum, destoam das características mantidas pelos antigos.

- Alguns túmulos velhos tiveram de ser refeitos porque as famílias não se interessaram em preservar, então decidimos manter algo mais simples - conta Eurides Pagel, presidente e coveiro por mais de 20 anos do Rega I.

Coordenada pela historiadora Elisiana Trilha Castro, uma equipe de oito pesquisadores percorreu os cemitérios Vila Itoupava, Rega I, Rega II, Braço do Sul e Treze de Maio, na Vila Itoupava, e Treze de Maio Alto, em Massaranduba. A intenção foi fotografar 1.567 sepulturas e catalogá-las com informações básicas sobre os sepultados entre o final do século 19 e atualmente, além de levantar sobrenomes, rituais, arquitetura dos túmulos e a história dos cemitérios.



Estudo procura perceber as singularidades dos cemitérios blumenauenses / 10/05/2011 /
Foto: Rafaela Martins / Agencia RBS



O estudo procura perceber as singularidades dos cemitérios blumenauenses, entender a participação dos imigrantes na formação do município e abre precedentes para que túmulos possam ser tombados como patrimônio cultural.

- É importante pensar na preservação desses lugares como um documento, e conservar as particularidades culturais das etnias que fizeram o cemitério. Hoje, as sepulturas são mais das famílias do que da sociedade e elas ainda não têm consciência da importância de preservar - explica Elisiana.



quarta-feira, 11 de maio de 2011

Portugal na rota do turismo cemiterial europeu

Lazer - Cemitérios atraem milhares de turistas

Em 2010, o cemitério dos Prazeres, em Lisboa, recebeu a visita de 8704 turistas, a maioria de nacionalidade alemã. Para incentivar este tipo de turismo, a Câmara de Lisboa tem roteiros próprios e promove a realização de palestras, colóquios, concertos de música sacra e erudita. Prazeres e Alto de São João são os cemitérios mais visitados em Lisboa.

Cemitérios dos Prazeres e do Alto de São João são os mais visitados em Lisboa. Foto: Bruno Colaço, 2011. Imagem disponível em 11/05/2011 no site: http://www.cmjornal.xl.pt/detalhe/noticias/nacional/portugal/cemiterios-atraem-milhares-de-turistas


Por Sónia Trigueirão. Artigo publicado em 08/05/2011 no site: http://www.cmjornal.xl.pt/ do jornal “Correio da Manhã” de Lisboa (Portugal) na Seção: Notícias – Nacional – Portugal.


Segundo Ana Paula Ribeiro, chefe de divisão de gestão cemiterial, a autarquia sempre deu destaque ao turismo cemiterial, criando até um núcleo museológico específico, que se julga único na Europa.

"Temos vindo a dinamizar o restauro do ‘espólio’ dos cemitérios de Lisboa enquanto museus a céu aberto, quer recuperando jazigos representativos, como o caso do Mausoléu dos Palmela, quer promovendo hastas públicas para venda de jazigos prescritos.

Mas Lisboa não é a única autarquia que incentiva este turismo, destacando-se também a cidade do Porto, que faz parte da rota dos cemitérios, do Conselho Europeu. Esta rota contempla cemitérios em Oslo, na Noruega; na ilha de Cerdena, Itália; ou em Bucareste, na Roménia. São mais de 50 cemitérios de 18 países europeus que se tornaram destinos turísticos.

Entre 2007 e 2010, mais de 910 turistas visitaram os cemitérios da cidade Invicta. Entre as actividades que a câmara promove para atrair visitantes, destaque para ‘A Semana à Descoberta dos Cemitérios Europeus’.

Há também concertos de órgão, exposições de fotografia, pintura e património móvel dos cemitérios municipais, palestras e visitas guiadas aos túmulos de grandes mestres da música do final do século XIX e do século XX.


TÚMULO DE VIOLONCELISTA NO PORTO

De um modo geral, o visitante dos cemitérios municipais do Porto – turista cultural, jovens, famílias, estudantes do Secundário ou universitários – faz uma visita geral e está receptivo à orientação dada pelo guia. Há, porém, um túmulo muito visitado por estrangeiros devido ao renome internacional de Guilhermina Suggia, considerada uma das melhores violoncelistas do Mundo. Uma visita aos cemitérios municipais do Porto permite ver um importante repositório de peças de arquitectura e escultura oitocentista, que constituem um manancial inesgotável de história socioeconómica e cultural.


OSCAR WILD DOS MAIS VISITADOS EM PARIS

Um dos cemitérios mais famosos do Mundo é o parisiense Père Lachaise, onde foram sepultados Jim Morrison (Doors), Edith Piaf, o escritor irlandês Oscar Wilde, o compositor italiano Gioachino Rossini e o escritor francês Marcel Proust. Os seus túmulos recebem milhares de visitas por ano. Igualmente famoso é o Cemitério ‘No Católico’, de Roma, conhecido como cemitério dos poetas e artistas, onde está o poeta John Keats e o fundador do Partido Comunista da Itália, Antonio Gramsci.



Veja também:

terça-feira, 3 de maio de 2011

Jequitinhonha (MG): Prefeito restitui à tribo Krenak restos mortais de antepassado

Alemanha participa de Encontro Indígena na cidade

"Figura de busto do botocudo Quack". (por volta de 1830). Óleo sobre tela, 62 x 51,5 cm. Autor: Príncipe Karl de Wied-Newied. Imagem disponível em 03/05/2011 no link: http://christinatranslations.com.br/DissertacaodeMestrado.pdf




Por Solange Pereira*. Publicado em 2011-03-01 às 17:49 no Site: http://curtirobi.webnode.pt/news/homenagem-ao-botocudo-e-ao-principe-encontro-indigena/



A cidade de Jequitinhonha, MG, no ano do seu 200º aniversário, realizará o "Encontro Indígena – Homenagem ao borun Kuêk e ao Príncipe Maximiliano de Wied", nos dias 13/14/15 de maio, ocasião em que serão restituídos à tribo Krenak os restos mortais do borun (“botocudo”) Kuêk, morto em 1834 na Alemanha e desde então expostos no Museu de Anatomia da Universidade de Bonn, trazidos pelo Cônsul-Geral da Alemanha no Brasil.


Jequitinhonha pediu, por uma questão de dignidade humana e amor a um filho do Vale, a devolução dos restos mortais, e a Alemanha concordou, por uma questão de correção política. Um ato de firmeza do Govêrno alemão, dada a resistência e a desaprovação de alguns grupos conservadores lá no país. Ao mesmo tempo, se prestará homenagem ao nobre alemão Maximiliano de Wied-Neuwied, que visitou a região do Baixo Jequitinhonha e se tornou amigo e protetor dos “botocudos” (a nação Borun) e de Kuêk em especial.



Vista da cidade de Jequitinhonha (MG) que comemora seu bicentenário. Imagem disponível em 03/05/2011 no site: http://radardovale.blogspot.com/2011/02/bicentenario-de-jequitinonha-umas-das.html



Intensas Negociações Multilaterais

Atuaram nas negociações o Prof. Karl Schilling,diretor do Museu de Anatomia da Universidade Friedrich-Wihelms, de Bonn, de maneira determinante (a ele cabia a palavra final, como guardião da relíquia); o dr. Uwe Kaerstner. ex-embaixador da Alemanha no Brasil e grande amigo do nosso País; a Embaixada do Brasil em Berlim; o Ministério do Exterior da Alemanha, e o dr. Roberto Botelho, prefeito de Jequitinhonha.


A relíquia será trazida até o Rio de Janeiro pelo diretor do museu, Prof. Karl Schilling, de lá até Jequitinhonha será acompanhada também pelo Cônsul-Geral alemão. O prefeito receberá a urna funerária das mãos do Cônsul, dr. Michael Worbs e, ato contínuo, a entregará à tribo Krenak, do tronco borun, que irá fazer o enterramento segundo seus rituais e crenças, em sua aldeia. Uma rua da Jequitinhonha será denominada "Kuêk", outra "Príncipe Max".


"Retrato do Príncipe Maximiliano de Wied-Neuwied com o botocudo Quack". (Assinado e datado de 1828). Óleo Sobre Tela, 210 x 126 cm. Autor: Johann Heinrich Richter. Imagem disponível em 03/05/2011 no link: http://christinatranslations.com.br/DissertacaodeMestrado.pdf



Reconhecimento das Raízes Indígenas da Cidade


Presentes, as nações Maxakali,Mucurin, Pataxó, Pankararu, Aranãs, e a já citada Krenak.; autoridades estaduais e municipais. E, naturalmente, o povo de Jequitinhonha, também protagonista nesse três dias de festas, conferências, debates, danças, cantos e mostra de artesanato indígena, num verdadeiro reencontro com suas raízes indígenas.


Jequitinhonha recebe de volta um filho do Baixo Vale, levado para longe pelas circunstâncias da vida (isso faz vocês lembrarem de alguma coisa, não é?). E o encontro das nações aqui na cidade significa um um aceno ao seu passado, em que era tão percorrido por povos de tantas culturas. E, certamente, um sinal para o seu futuro, como cidade das artes, das culturas, aberta para o mundo.

*Secretária-Executiva /
Comissão do Bicentenário de Jequitinhonha


Fonte: http://curtirobi.webnode.pt/news/homenagem-ao-botocudo-e-ao-principe-encontro-indigena/


Veja também:


http://www.dzai.com.br/dinge/noticia/montanoticia?tv_ntc_id=46189


http://radardovale.blogspot.com/2011/02/bicentenario-de-jequitinonha-umas-das.html


http://www.brasil.diplo.de/Vertretung/brasilien/pt/__events/in__Rio/2011__05__Jquitinhonha.html


http://blogdobanu.blogspot.com/2011/02/jequitinhonha-promove-resgate-de-povos.html

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Araraquara (SP): Ossada humana encontrada em escola estadual é de antigo cemitério

Local tem túmulos do século XIX; arqueólogo deve exumar restos mortais



Uma ossada humana foi encontrada na tarde de terça-feira (12), durante as obras para reforma de uma instituição de ensino em Araraquara (SP), a Escola Estadual Antônio Joaquim de Carvalho (Anjoca), que fica na Praça Pedro de Toledo, no centro da cidade. Foto: Araraquara.com. Imagem disponível em 15/04/2011 no site:http://www.saibaja.com.br/not/5917#



Por EPTV reportagem de Caroline Dulley para o Jornal Regional postada no site: http://eptv.globo.com/noticias em 13/04/2011 - 18:00


A ossada humana encontrada na terça-feira (12/04) na Escola Estadual Antônio Joaquim de Carvalho, em Araraquara, é de um antigo cemitério que existia no local no século XIX.



O crânio e alguns ossos estavam a um metro de profundidade no local onde será a nova cozinha da escola, que está fechada para reformas.


Local da escola onde foram encontrados os ossos. Imagens de vídeo feitas por Pedro Santana para EPTV e captadas em 15/04/2011 do site: http://eptv.globo.com/noticias



O pedreiro Agnaldo Guimarães do Prado levou um susto ao encontrar a ossada. “Eu estava cavando e encontrei um cadeado, depois continuei cavando e encontrei o crânio”, disse.



História



O primeiro cemitério da cidade ficou no local entre 1840 e 1880. Era o único local onde os mortos eram enterrados. Por isso, é possível ver ainda alguns tijolos, que formavam um antigo túmulo.


Cavando para fazer a nova caixa de gordura da cozinha o passado veio a tona. Imagens de vídeo feitas por Pedro Santana para EPTV e captadas em 15/04/2011 do site: http://eptv.globo.com/noticias



Ainda devem existir outras ossadas. “Dependendo do poder aquisitivo, a pessoa era enterrada em um caixão ou em um tecido diretamente na terra”, disse a socióloga e pesquisadora Tereza Telarolli.



Escola Estadual Antônio Joaquim de Carvalho. Imagens de vídeo feitas por Pedro Santana para EPTV e captadas em 15/04/2011 do site:http://eptv.globo.com/noticias





A escola foi tombada pelo patrimônio histórico e cultural do Estado de São Paulo e, por isso, a pesquisadora acredita que faltou orientação aos funcionários durante a obra. “Haveria necessidade de que os órgãos competentes tivessem alertado a empresa responsável pelas obras de que foi um cemitério. Deveria ter um acompanhamento de um arqueólogo", explicou.


A empresa responsável pela reforma informou que não recebeu nenhuma orientação e nem que havia um cemitério antigo no local.


Detalhe da ossada encontrada: em meio aos ossos um cadeado. Imagem disponível em 15/04/2011 no site: http://araraquarahoje.blogspot.com/2011/04/ossada-e-localizada-em-predio-de-escola.html




Os ossos estão sob a proteção da Guarda Municipal. Um arqueólogo analisou os restos mortais na tarde desta quarta-feira (13/04) e aguarda uma autorização para uma exumação.





Veja também:


12/04/2011: Ossada humana é encontrada durante reforma de escola estadual -


http://eptv.globo.com/noticias/NOT,3,7,344142,Ossada+humana+e+encontrada+durante+reforma+de+escola+estadual+Antonio+Joaquim+de+Carvalho+em+Araraquara.aspx


http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI5072850-EI8139,00-SP+ossada+e+encontrada+em+escola+estadual+de+Araraquara.html


http://www.saibaja.com.br/not/5917#


http://araraquarahoje.blogspot.com/2011/04/ossada-e-localizada-em-predio-de-escola.html


http://gazetadeamerico.blogspot.com/2011/04/ossada-do-seculo-xix-e-encontrada-em.html


http://noticias.r7.com/sao-paulo/noticias/funcionarios-encontram-ossada-humana-enterrada-dentro-de-escola-no-interior-de-sp-20110412.html